Por Nivaldo Cleto*
Neste segundo dia se deu a sessão de atualização de assuntos legislativos e regulatórios da ICANN, que periodicamente fornece à comunidade uma série de informações vindas de todo o mundo que possuem potencial de afetar o fluxo do desenvolvimento de políticas da comunidade e de afetar os modelos de negócio das partes contratadas da ICANN.
A iniciação teve início no tema do processo da ONU de revisão do WSIS (World Summit on the Information Society, ou Cúpula Mundial da Sociedade da Informação) em maio de 2024. Esse evento está sendo visto como uma prioridade pela ICANN, já que o WSIS original é considerado um dos eventos mais importantes relativos à validação do modelo multisetorial de governança da Internet. Essa revisão decidirá, entre outras coisas, a continuidade do Fórum de Governança da Internet (IGF). A ICANN tem feito esforços de engajamento com governos do mundo para reforçar a necessidade da preservação do modelo multisetorial.
Uma questão importante que emergiu no entorno de outro processo da ONU, o Global Digital Compact (GDC, sem tradução oficial). Dentro desse processo foi feita uma declaração de Amandeep Gill, Embaixador de Tecnologia do Secretário-Geral, na qual afirmou que o futuro da governança da Internet se dará dentro de um modelo “tripartite”, na qual existiriam governos, setor privado, e sociedade civil. Isso muda completamente a noção seguida desde os primórdios da governança, na qual a comunidade técnica é um ator distinto. Na visão de Gill, atores como a ICANN e o IETF[i] passariam a fazer parte da sociedade civil.
Isso trouxe uma resposta forte da CEO atuante da ICANN, Sally Costerton, na qual a ICANN condenou a tentativa como uma manobra dos Estados para minimizar o papel da comunidade técnica, posicionando que isso contraria fortemente os princípios estabelecidos pelo WSIS e reafirmados pelo WSIS+10. A resposta reforçou a importância da separação da comunidade técnica da sociedade civil, em vista de que muitos fazem um papel extremamente técnico do qual as estruturas básicas da Internet dependem, tendo portanto uma visão única de várias questões.
Reunião da Coordenação do CGI.br com os líderes da Business Constituency – Vinicius Santos, Mark Datysgeld, Steve DelBianco, Renata Mieli e Mason Cole
Já no contexto da União Europeia, foi destacado o documento “EU Council Conclusions on digital diplomacy”, no qual a ICANN foi citada diretamente na passagem que diz “Reconhecendo a importância da questão e o cronograma crítico dos próximos processos relacionadas à governança da Internet (…), isso inclui suporte ativo da Internet Corporation for Assigned Names e Números (ICANN) em questões de importância estratégica, como garantir a estabilidade, segurança e interoperabilidade da Internet”. Isso sinaliza uma posição favorável da União Européia em relação à continuidade do trabalho da ICANN dentro de sua estrutura multisetorial.
A União Européia também tem mostrado uma forte tendência de abraçar esforços e fóruns de padronização, como representado em sua estratégia de padronização de 2022, incentivando uma maior presença de seus representantes em fóruns como o IETF. Também já estão olhando para o conceito de “Web 4.0” e mundos virtuais, trazendo questões de padronização desses mundos futuros para que possam ser abertos e interoperáveis.
Sobre a região da Ásia e Pacífico, tivemos uma atualização geral na qual foram mencionadas prioridades de alguns países. Na Australia existe um ato de privacidade sendo modernizado que podem impactar a comunidade ICANN, em vista de que possui uma maior definição de o que é uma informação pessoal, como se deve lidar com endereços de IP, e questões como remoção de conteúdo em 72 horas quando há razoabilidade. Bangladesh terá um novo ato de cibersegurança que pode afetar o nível do DNS[ii]. Na Índia, o Digital Personal Data Protection entrou em vigor mas não se sabe seu impacto em nosso trabalho.
Entrevista com os coordenadores da Escola da Governança da Internet na América Latina, Adrian Carballo e Olga Cavalli
(*) Nivaldo Cleto é empresário de contabilidade e de certificação digital, conselheiro do Comitê Gestor da Internet no Brasil CGI.br e membro da ICANN Business Constituency – BC