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Diário da ICANN60 Abu Dhabi – Final

Tecnologia

Por Nivaldo Cleto*

03/11/2017

Terminando uma muito movimentada semana de debates dentro da ICANN 60. A reunião ainda teve fôlego para tratar de outros assuntos, além da eleição de Manal Ismail como nova líder dos governos dentro do GAC, a aposentadoria de Steve Crocker como presidente da Board e subsequente passagem do cargo para Cherine Chalaby. Foi acalorada a discussão pública em torno do domínio .amazon e foram feitas uma quantidade volumétrica de debates sobre o GDPR da União Europeia (Regulamentação Geral de Proteção de Dados), que deve alterar completamente as regras do banco de dados WHOIS.

Um ponto muito importante é que a ICANN começa a se mover lentamente na direção de gerar dados abertos de maior qualidade, em um esforço liderado por Cathy Petersen e Steve Conte. O primeiro piloto da Open Data Initiative foi conduzido em junho de 2017, testando as plataformas Enigma, OpenDataSoft, e Socrata, somadas a uma solução interna desenvolvida pela ICANN. Pouca movimentação da comunidade resultou desse primeiro movimento, pois esse era ainda um esforço muito primário e experimental.

O grupo identificou alguns problemas que são considerados chave no que é relativo ao tipo de relatórios oferecidos pela ICANN atualmente. O primeiro e mais notável é que os relatórios públicos não são legíveis por máquinas e não há um processo automático instaurado para sua geração. Além disso, o dataset não é completo, com alguns dos dados simplesmente não sendo publicados.

Os dados que existem hoje a respeito de todas as operações da ICANN e sua comunidade estão espalhados em múltiplas plataformas, disponíveis em uma variedade de formatos contendo graus diferentes de metadados, sendo que alguns não são passíveis de download. É necessário saber a quem pedir um dado para obtê-lo, de modo que alguém externo ao processo não consegue se aproximar dele de modo qualificado.

O foco do projeto está na automação da entrega dos dados, na montagem de uma interface agnóstica que permita a inspeção casual do dataset, e no estabelecimento de um processo com continuidade e repetibilidade que seja utilizado por toda a instituição de um modo que seja compatível tanto com suas necessidades quanto com os objetivos da comunidade.

Não se sabe quantos dados a ICANN tem, e quais podem ou não ser tornados públicos. Um exemplo de dado durante a exposição foi o de recursos humanos na ICANN: gênero e salário, questões que são publicadas nos relatórios públicos da instituição, mas cujos dados específicos podem ser úteis para a formação de políticas.

O segundo piloto está em andamento para dezembro de 2017, nas plataformas OpenDataSoft e Socrata. As perguntas agora são focadas no que a comunidade quer, se é possível baixar todos os dados, que tipo de visualizações podem ser feitas, se é possível exportar para mais mídias como HTML5 e CSV. Os expositores disseram que estão aprendendo como conduzir o processo na base da experiência.

Alguns dados interessantes levantados durante a sessão:

1)      A quantidade impressionante de 571 websites são criados por minuto.

2)      Os pedidos de DNS ainda são 90% focados no binômio .com/.net, mas em termos absolutos esse volume está caindo aos poucos, mesmo que de modo discreto.

3)      Os pedidos de DNS de marcas (os chamados .brands) são bem mais relevantes que os geográficos, indiciando onde o tráfego dos novos TLDs realmente está.

4)      Como em todo estudo, é importante observar a relação entre eventos para aferir problemas dentro do DNS. A teoria de que os novos TLDs aumentaram o nível de SPAM na rede não resiste a uma análise mais dura, que demonstra que ele migrou de TLDs antigos para os novos, sem necessariamente aumentar tanto seu volume total.

Outro evento sempre importante em todas as reuniões da ICANN é o communiqué [SIC] do GAC, que delimita o consenso geral entre os diversos governos presentes na reunião, sinalizando uma direção para a relação com estes atores no futuro próximo. Em primeiro lugar ficaram estabelecidos como Vice Chairs:

  • Guo Feng (China)
  • Ghislain de Salins (France)
  • Milagros Castañon (Peru)
  • Chérif Diallo (Senegal)
  • Pär Brumark (Niue)

Salta aos olhos a indicação de Castañon para uma posição de tamanho destaque, pois a delegada é conhecida por adotar uma postura altamente agressiva, um tanto diferente dos posicionamentos moderados das delegações do Brasil e Argentina. Será importante observar o que isso significará para a região LAC em médio prazo.

No tema de Jurisdição, se mostraram como insatisfeitos com o trabalho conduzido no Work Stream 2, apontando que continuam preocupado com as consequências de a ICANN ter sua sede na Califórnia. Também não estão satisfeito com o consenso sendo alcançado no tema de Intergovernmental Oganization (IGO) Protections, pois a eles parece que a decisão entrará em conflito com o conselho do GAC.

No tema de Inclusão, as demandas do GAC se conectam mesmo que não explicitamente com o projeto ODI já citado no início desse relatório, pois pedem que a documentação da ICANN seja mais facilmente acessada por partes externas que não necessariamente sejam especialistas no processo. Pedem que os documentos sejam mais compreensíveis e a ICANN enquanto instituição produza mais sumários e apresentações úteis.

No que é pertinente ao GDPR, se colocaram como favoráveis à manutenção do WHOIS/RDS como mecanismo de proteção de comércio, propriedade intelectual e autoridade policial, ressaltando que é necessário que os dados sejam tornados disponíveis para atores relevantes que precisem deles para conduzir as funções citadas.

Por fim, no tema do “.amazon”, o consenso geral é o de permitir o uso do domínio pela Amazon ao invés de simplesmente executar um bloqueio, mas ainda é nebuloso sob quais termos o GAC pretende permitir que isso ocorra, e deixaram claro que mais negociações serão necessárias para que se chegue em um ponto adequado.

A reunião de número 60 foi fechada com o Public Forum, onde a comunidade tem o direito de se expressar perante a Board. Andrew Mack, atual chair da Business Constituency (BC), aproveitou a oportunidade para falar de sua experiência de ter se formando em Estudos Latino Americanos e trabalhado no Brasil, Peru, e demais países amazônicos desde a década de 1990. Salientou que seu pensamento sempre foi de que a região possui muito valor econômico, e encontrar maneiras justas e adequadas de explorar seus ativos é essencial para gerar negócios sustentáveis e beneficiar a todos os envolvidos com o território.

 

*Nivaldo Cleto é conselheiro do CGI.br e membro da ICANN Business Constituency

 

 

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