Advogados avaliam que um período de transição é imprescindível para continuidade das atividades
Juliana Garçon
jgarcon@brasileconomico.com.br
A migração para o processo judicial eletrônico virou celeuma entre advogados e o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP). Os advogados argumentam que o processo está ocorrendo “no susto”, sem diálogo, e que há muitas dúvidas em relação ao sistema adotado pela corte. Eles se disseram surpresos pela decisão do TJ-SP de suspender os prazos nas varas cíveis do Fórum João Mendes (Central), nas varas cíveis instaladas nele e nas varas de Júri do Fórum Mário Guimarães (Barra Funda).
O aviso veio no dia 9 e previa a suspensão no intervalo entre 16 e 29 deste mês. Diante das dificuldades e pressões, a interrupção foi adiada para o período entre 22 de outubro a 6 de novembro. Nestas duas semanas, o Puma (Plano de Unificação, Modernização e Alinhamento) está em implantação e os funcionários estão em treinamento.
Entre o dia 6 e o dia 19, os funcionários trabalharão com o novo sistema, mas o processo eletrônico ainda não será adotado. A partir daí, o TJ-SP vai “virar a chave”, passando a aceitar os processos por meio digital. O processo foi considerado repentino pelas entidades que representam os advogados paulistas. Para contornar os problemas de adaptação e prazos, elas têm buscado reuniões com representantes do tribunal. Num desses encontros, o presidente da corte, desembargador Ivan Sartori, concordou com a instalação de um terminal de atendimento para auxiliar profissionais na instalação do sistema de processo eletrônico.
“É necessário um período de testes de ao menos 90 dias. Mas temos só um mês”, diz Arystóbulo de Oliveira Freitas, presidente da Associação dos Advogados de São Paulo (AASP). De acordo com ele, nos foros onde já foi implantado, na região de Jundiaí, o sistema esta transformando as atividades em uma grande confusão.
As entidades pediram, a princípio, que a migração foi adiada para fevereiro, mas já sabem que a demanda não deverá ser atendida. Por isso, pedem alguma extensão no prazo e um período de adaptação, durante o qual advogados poderiam entregar processos tanto em meio digital quanto em papel. “Não se pode virar a chave de uma vez. A implantação deve ser por fases”, reafirma Freitas.
Dúvidas no fórum
O plano do Tribunal de Justiça paulista prevê migração de 79% das varas do Estado e capacitação de 30 mil servidores até o fim do ano que vem. O treinamento presencial contempla magistrados e formadores (coordenadores, supervisores, chefes e escreventes). Os demais receberão capacitação por ensino à distância. Os representantes dos advogados consideram a metodologia inadequada e insuficiente. “Não dá para acreditar que os multiplicadores conseguirão ensinar os demais funcionários com essa facilidade e tão rápido”, diz Augusto Marcacini, presidente da Comissão de Sociedade Digital da OAB-SP. Ontem, os juízes Gustavo Santini Teodoro e Fernando Tasso, assessores da presidência do tribunal para assuntos de informática, falaram a 40 juizes, promotores e defensores do fóruns João Mendes e da Barra Funda sobre a implementação do sistema. Procurados pela reportagem do BRASIL ECONÔMICO para comentar as dificuldades na migração para o meio digital, os juízes não retornaram o contato. O tribunal limitou-se a informar, por meio da assessoria de imprensa do TJ-SP, que o objetivo do Puma é unificar a linguagem das varas, que todos os 2.048 juízes serão treinados presencialmente. Também afirmou que, até o fim do ano que vem, 40% das varas do estado devem estar totalmente digitalizadas. ■
Certificação digital terá gargalo, prevê especialista
Nas primeiras semanas de funcionamento do processo judicial eletrônico, a Justiça paulista sofrerá um apagão na distribuição de casos, prevê Augusto Marcacini, presidente da Comissão de Sociedade Digital da OAB-SP. Isso porque a maioria dos advogados não possui a certificação digital, que funciona como assinatura nos meios eletrônicos. “Seria preciso emitir 30 mil certificados por semana para dar fluxo aos processos.” A categoria não está preparada, argumenta, porque não houve uma programação adequada. “Certificações emitidas em 2006, ano da lei do processo eletrônico, já expiraram duas vezes. Não havia por que obtêla sem previsão de quando ela seria usada”, explica. “Tecnologia sempre pode dar problema. Por isso, a implementação de novidades tem de ser gradual”, reforça, para exemplificar: os advogados também vão encontrar problemas se estiverem usando versões desatualizadas do sistema operacional Windows nas versões XP ou 2003 server. Usuários da marca Apple, por sua vez, deverão enfrentar incompatibilidade com o sistema adotado pela corte. “Já imaginou ter de comprar um computador novo só para usar o processo eletrônico?”, aponta. A certificação pode ser emitida pela OAB, pela AASP ou pelos Correios. ■ J.G.
Advogados reagem a prazos para mudança
A migração, avaliam representantes da categoria, ocorre de forma apressada, sem a preparação de servidores e estrutura de transmissão de dados
Três entidades de representação dos advogados paulistas – OABSP (Ordem dos Advogados do Brasil, secção São Paulo), IASP (Instituto dos Advogados de São Paulo) e AASP (Associação dos Advogados de São Paulo) – reuniram-se ontem com representantes do Tribunal de Justiça de São Paulo para tentar negociar prazos e condições para a implantação do processo eletrônico nos foros do estado.
Na véspera, as entidades haviam enviado à corte ofício no qual manifestaram as suas preocupações com o ritmo do processo. A migração, avaliam representantes da categoria, está ocorrendo apressadamente, sem a devida preparação de servidores, advogados e estrutura de transmissão de dados. Na representação, as entidades fizeram demandas para garantir a tranquilidade da transição. (Veja quadro)
Uma delas foi a implementação de “centrais facilitadores” nos fóruns. Nelas, haveria serviços para auxiliar os advogados menos integrados à tecnologia. “É importante haver scanners e servidores capacitados, por exemplo, para digitalizar os documentos”, diz Augusto Marcacini, presidente da Comissão de Sociedade Digital da OAB-SP. Ele ressalta que no universo da advocacia paulista — quase 300 mil profissionais — há um grupo grande sem condições de fazer a migração imediatamente, seja por falta de entendimento da tecnologia, seja por falta de equipamentos com a configuração mínima necessária. “Estamos dialogando com o TJ-SP há dez anos sobre o assunto. Eles já adotaram um sistema e, depois, mudaram o projeto. Agora, estão tentando resolver em apenas dois meses os problemas acumulados em tantos anos.” As dificuldades não se limitam aos escritórios, mas também se relacionam à infraestrutura de comunicações dos foros, diz Arystóbulo de Oliveira Freitas, presidente da AASP. “Nas cidades onde o sistema já foi implantado, como Jundiaí, advogados têm sofrido com a queda de conexão. Por isso, perderam prazos. Imagine o problema do universo de 20 milhões de processos em andamento no estado.” ■
Do Brasil Econômico