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Artigo – Obrigação acessória, pessoas jurídicas imunes e isentas e escrituração contábil digital

Contabilidade

Nova obrigação acessória para 2014 – Pessoas Jurídicas imunes e isentas – Escrituração Contábil Digital (ECD) 

Essa nova obrigação atingirá mais de 300 mil pessoas jurídicas imunes e isentas. Segundo dados da Receita Federal, até dezembro de 2013, estavam registradas mais de 291 mil, praticamente o dobro das pessoas jurídicas que declararam com base no Lucro Real (153 mil, no mesmo ano) – sem sombra de dúvidas, um novo nicho de mercado para os profissionais da Contabilidade. 

Antes, porém, da abordagem propriamente dita da obrigação em comento, uma pequena digressão sobre os institutos da imunidade e da isenção no direito brasileiro e das pessoas jurídicas que se enquadram para o gozo desses benefícios. 

Tem-se observado uma certa dificuldade na distinção entre imunidade e isenção. A imunidade tributária é uma limitação ao poder de tributar que advém da Constituição Federal e que não pode ser suprimida ou reduzida por lei ordinária ou complementar ou qualquer outro ato normativo; é uma hipótese de não incidência constitucionalmente qualificada. No tocante à isenção, esta é conferida pela lei, em seu sentido restrito. Na isenção o fato gerador está no campo de incidência, todavia, a lei o excetua da tributação, ou seja, a isenção é exceção feita por lei. 

No que diz respeito à imunidade a Constituição Federal define, em seu artigo 150, as entidades imunes, a saber: 

1 – templos de qualquer culto

2 – partidos políticos, inclusive suas fundações;

3 – entidades sindicais dos trabalhadores,

4 – instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos, atendidos os requisitos da lei. 

Não obstante, para os entes citados nos itens “2” a “4” gozarem do benefício, o Código Tributário Nacional – CTN, em seu artigo 9º, os subordinam à observância dos seguintes requisitos: I – não distribuírem qualquer parcela de seu patrimônio ou de suas rendas, a qualquer título; II – aplicarem integralmente, no País, os seus recursos na manutenção dos seus objetivos institucionais; e III – manterem escrituração de suas receitas e despesas em livros revestidos de formalidades capazes de assegurar sua exatidão. 

E, no caso particular das instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos, a Lei n.º 9.532/1997, Art. 12, ao disciplinar a matéria, acrescentou outros requisitos, saber: 

a) preste os serviços para os quais houver sido instituída e os coloque à disposição em geral, em caráter complementar às atividades do Estado, sem fins lucrativos; 

b) não remunerar, por qualquer forma, seus dirigentes pelos serviços prestados; 

c) aplicar integralmente seus recursos na manutenção dos seus objetivos sociais; 

d) manter escrituração completa de suas receitas e despesas em livros revestidos das formalidades que assegurem a respectiva exatidão; 

e) conservar em boa ordem, pelo prazo de cinco anos, contados da emissão, os documentos que comprovem a origem de suas receitas e a efetivação de suas despesas, bem assim a realização de quaisquer outros atos ou operações que venham a modificar sua situação patrimonial, dentre outros. 

A imunidade não é subjetiva; ela abrange apenas os resultados relacionados com as finalidades essenciais dessas entidades. Assim, os rendimentos e os ganhos de capital auferidos em aplicações financeiras de renda fixa e variável não estão abrangidos pela imunidade prevista na Constituição. 

No que tange à isenção, que também não é subjetiva, a citada lei 9.532, em seu Art.15, estabelece que se consideram isentas as instituições de caráter filantrópico, recreativo, cultural e científico e as associações civis que prestem os serviços para os quais houverem sido instituídas e os coloquem à disposição do grupo de pessoas a que se destinam, sem fins lucrativos, devendo, igualmente como as imunes, observar: 

a) não remunerar, por qualquer forma, seus dirigentes pelos serviços prestados; 

b) aplicar integralmente seus recursos na manutenção dos seus objetivos sociais; 

c) manter escrituração completa de suas receitas e despesas em livros revestidos das formalidades que assegurem a respectiva exatidão; 

d) conservar em boa ordem, pelo prazo de cinco anos, contados da emissão, os documentos que comprovem a origem de suas receitas e a efetivação de suas despesas, bem assim a realização de quaisquer outros atos ou operações que venham a modificar sua situação patrimonial, dentre outros. 

Atentar para o fato de que uma entidade é considerada sem fins lucrativos quando não apresenta superávit em suas contas ou, caso o apresente em determinado exercício, destine referido resultado, integralmente, à manutenção e ao desenvolvimento dos seus objetivos sociais. 

Após essa pequena introdução aos institutos da imunidade e da isenção e das obrigações acessórias para o gozo do beneficio, passemos a apreciar a grande novidade da adoção da Escrituração Contábil Digital – ECD. 

A obrigatoriedade das pessoas jurídicas imunes e isentas de enviar a escrituração contábil para o sped, a partir do ano-calendário 2014, foi instituída pelo Decreto 7.979, de 08 de abril de 2013, ao dar nova redação ao artigo 2º do Decreto 6.022/2007, que trata do Sistema Público de Escrituração Digital, verbis: 

Art. 2º O Sped é instrumento que unifica as atividades de recepção, validação, armazenamento e autenticação de livros e documentos que integram a escrituração contábil e fiscal dos empresários e das pessoas jurídicas, inclusive imunes ou isentas, mediante fluxo único, computadorizado, de informações. (Redação dada pelo Decreto nº 7.979, de 8 de abril de 2013) (grifamos). 

Até 31/12/2013 essas entidades, para gozarem do benefício a que fazem jus, como já vimos, estavam obrigadas a manter escrituração completa de suas receitas e despesas em livros revestidos das formalidades que assegurem a respectiva exatidão, contudo, estavam fora do sped. Em outras palavras, estavam obrigadas a promoverem a escrituração contábil completa em papel. Agora, com a obrigação estabelecida no Decreto já citado, juntamente com a edição da Instrução Normativa RFB nº 1.420, de 19 de dezembro de 2013, como já foi tratado em outro trabalho nosso, o panorama fica alterado, e tudo passará a ser digital. 

Com efeito, a instrução normativa instituiu a Escrituração Contábil Digital – ECD e traçou as principais normas como as a seguir destacadas: 

Art. 1º Fica instituída a Escrituração Contábil Digital (ECD), para fins fiscais e previdenciários, de acordo com o disposto nesta Instrução Normativa. 

Parágrafo único. A ECD deverá ser transmitida, pelas pessoas jurídicas obrigadas a adotá-la, ao Sistema Público de Escrituração Digital (Sped), instituído pelo Decreto nº 6.022, de 22 de janeiro de 2007, e será considerada válida após a confirmação de recebimento do arquivo que a contém e, quando for o caso, após a autenticação pelos órgãos de registro. 

Art. 2º A ECD compreenderá a versão digital dos seguintes livros: 

I – livro Diário e seus auxiliares, se houver; 

II – livro Razão e seus auxiliares, se houver; 

III – livro Balancetes Diários, Balanços e fichas de lançamento comprobatórias dos assentamentos neles transcritos. 

Parágrafo único. Os livros contábeis e documentos de que trata o caput deverão ser assinados digitalmente, utilizando-se de certificado de segurança mínima tipo A3, emitido por entidade credenciada pela Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira (ICP-Brasil), a fim de garantir a autoria, a autenticidade, a integridade e a validade jurídica do documento digital. 

Art. 3º Ficam obrigadas a adotar a ECD, nos termos do art. 2º do Decreto nº 6.022, de 2007, em relação aos fatos contábeis ocorridos a partir de 1º de janeiro de 2014: 

I- ………………………………………………………………………………………………….. 

III – as pessoas jurídicas imunes e isentas. 

…………………………………………………………………………. 

Art. 5º A ECD será transmitida anualmente ao Sped até o último dia útil do mês de junho do ano seguinte ao ano-calendário a que se refira a escrituração. 

Como se vê, a partir de 2014 às pessoas jurídicas imunes e isentas foi imposta mais uma nova obrigação acessória de grande monta que irá exigir dessas entidades, além de uma reorganização administrativa dos departamentos envolvidos no atendimento das informações que serão requeridas, investimentos significativos para a consecução desse mister. 

Por importante, não se pode olvidar que a falta de entrega da ECD acarretará multas (art. 10 da IN 1.420/2013/art. 57 da MP 2.158-35/2001) para as entidades inadimplentes de R$ 500,00 (quinhentos reais) por mês-calendário ou fração de atraso, o que, convenhamos, irá dificultar a vida de muitas pequenas associações civis, sem fins lucrativos. 

Também é verdade que não se pode deixar de vislumbrar que os investimentos requeridos, seja para um departamento próprio de TI, seja para contratação de um terceirizado, poderá atrapalhar o funcionamento das pequenas associações, como por exemplo, de pescadores, de catadores de lixo e outras tantas. 

Por outro lado, até a instituição da ECD neste ano-calendário (a primeira ECD será entregue em 2015), a obrigação mais importante e, diga-se de passagem, bastante simples, era a apresentação da DIPJ. É bem verdade, como dito anteriormente, que todas estavam obrigadas à escrituração contábil completa, entretanto, uma boa parte dessas pequenas entidades imunes e isentas não cumpria a obrigação de ter uma contabilidade circunstanciada. E, por sua vez, o fisco era, e ainda é pouco atuante nesse setor. 

Esta situação, salvo melhor juízo, concorreu para uma explosão de ONG’s com objetivos duvidosos, decorrendo daí inúmeros casos de desvios de finalidades e de verbas, tornando o ambiente propício a toda sorte de ilicitudes, notadamente pela falta de contabilização dos fatos ocorridos nessas instituições. 

Agora, com a exigência da Escrituração Contábil Digital – ECD espera-se um choque de arrumação. Primeiramente, o fisco passará a ter um controle efetivo dessas entidades, podendo controla-las a distancia pelas informações recebidas e armazenadas em seus sistemas. Em segundo lugar, com a escrituração contábil efetiva por parte dessas pessoas jurídicas, que será exigida anualmente, o que antes não era, haverá, com certeza, um estancamento dos desvios, além de facilitar a auditoria, quando for o caso. 

Essa nova obrigação acessória irá impactar o mercado de trabalho dos contabilistas em todo o país, requerendo, desses profissionais, conhecimento técnico, dedicação e bastante orientação aos possíveis novos clientes que advirão. 

Para se ter uma ideia do acréscimo, já que todos serão clientes novos (serviços recém-demandados), segundo dados da Receita Federal, em 2013, estavam registradas 93.374 (noventa e três mil, trezentos e setenta e quatro) Pessoas Jurídicas Imunes e 197.709 (cento e noventa e sete mil, setecentos e nove) Pessoas Jurídicas Isentas. 

Finalmente, vale lembrar que a classe contábil brasileira se encontra devidamente preparada para enfrentar o desafio, mormente, pelo o apoio e acompanhamento da capacitação dos seus filiados por parte do Conselho Federal de Contabilidade e dos Conselhos Regionais de Contabilidade, que formam o reconhecido sistema CFC/CRC’s.

Fortaleza, julho de 2014 

* Osvaldo Rodrigues da Cruz é contador e conselheiro do Conselho Federal de Contabilidade 

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