Algumas das principais alterações para os investidores pessoa física envolvem a unificação de alíquotas e novos valores cobrados
A Medida Provisória 1171/2023 publicada pelo Governo no último domingo (30) promete dar uma virada na tributação de rendimentos recebidos no exterior por pessoas físicas, entidades controladas e trusts – fundos usados para administrar valores de terceiros.
Para quem é pessoa física e possui conta de investimento no exterior, a principal mudança está na unificação das alíquotas, já que anteriormente havia uma cobrança diferenciada para juros, dividendos, ganhos de capital, entre outros, segundo especialistas consultados pelo InfoMoney.
Outro ponto de atenção, de acordo com os profissionais, está nas alíquotas que sofreram alteração. Agora, rendimentos auferidos em aplicações financeiras no exterior por pessoas físicas residentes no Brasil passam a ser tributados com alíquotas que podem variar de zero até 22,5%, a depender do volume de ganhos obtidos, a partir de janeiro de 2024.
Nesse caso, se o rendimento for menor do que R$ 6.000, não haverá incidência de tributação. Já para ganhos entre R$ 6.000 e R$ 50.000, a alíquota cobrada será de 15%. Ganhos acima de R$ 50.000, por sua vez, serão tributados em 22,5%.
As novas taxas valem para qualquer tipo de ativo financeiro, sejam eles ações, bonds (títulos de dívida emitidos no exterior), fundos ou ETFs (fundos de índices).
Ainda que o Governo tenha apresentado o texto agora, é importante lembrar que a medida só entrará em vigor a partir de 1º de janeiro de 2024 e haverá ainda a necessidade de aprovação do Legislativo.
Logo, há chance de que a medida seja aperfeiçoada por meio de emendas durante a sua tramitação no Congresso e que haja alterações em seu texto, como lembra o head de offshore da Manchester Investimentos, Rafael Haubrich.
Entenda agora o que deve mudar em oito perguntas:
1) Quais são as mudanças previstas na MP que podem afetar o investidor pessoa física?
Ao falar sobre pessoa física que investe diretamente lá fora, por meio de contas de investimento no exterior, Haubrich, da Manchester, afirma que a principal diferença está na unificação de taxas, já que anteriormente havia cobrança de valores diferenciados para o pagamento de juros, dividendos e ganho de capital.
Segundo o texto da MP, rendimentos auferidos a partir de 2024 em aplicações financeiras em geral no exterior por pessoas físicas residentes no País passam a ser tributados com alíquotas que podem variar de zero a 22,5%, a depender dos ganhos obtidos.
Se o rendimento for menor do que R$ 6.000, não haverá incidência de tributação. Já para ganhos acima de R$ 6.000 e abaixo de R$ 50.000, a alíquota cobrada será de 15%. Ganhos acima de R$ 50.000, por sua vez, serão tributados em 22,5%.
Nesse caso, ao fim do ano, a ideia é que todos os rendimentos sejam consolidados, ou seja, somados na declaração de Imposto de Renda em separado para saber qual será a alíquota final cobrada do investidor, afirma o sócio do Mauler Advogados, Igor Mauler Santiago.
Embora haja algumas diferenças, a MP manteve alguns pontos da tributação como ocorre hoje. Um deles é referente ao momento em que incide a tributação para a pessoa física que investe diretamente no exterior. O texto prevê que a cobrança irá ocorrer quando o investimento for “apropriado”. Ou seja, no momento do resgate, do pagamento de juros, da amortização etc.
2) Muda alguma coisa para investidores pessoa física que realizam compra e venda de ações no exterior?
Sim. De acordo com Santiago, do Mauler Advogados, as vendas de ações em Bolsas de Valores no exterior estarão sujeitas a essas mesmas alíquotas – e não mais à tabela do Imposto de Renda que trata de ganho de capital.
Até agora, os lucros com as ações – ou ganhos de capital – eram tributados de acordo com uma tabela progressiva, em que o imposto variava de 15% a 22,5%, a depender dos ganhos obtidos.
Para ganhos abaixo de R$ 5 milhões, a alíquota cobrada era de 15%. Já para ganhos entre R$ 5 milhões e R$ 10 milhões, a tributação era de 17,5%, e entre R$ 10 milhões e R$ 30 milhões, a alíquota chegava a 20%. Já para ganhos acima de R$ 30 milhões, o percentual cobrado era de 22,5%.
O especialista explica que, com a nova regra, o investidor alcançará mais rapidamente a alíquota máxima, que é de 22,5%. Se atualmente é preciso ter ganhos acima de R$ 30 milhões, pela nova regra, o investidor precisaria ter ganhos apenas acima de R$ 50 mil.
3) Os rendimentos que o investidor obtiver em diferentes investimentos no exterior serão contabilizados individualmente, ou os valores serão somados?
Conforme explica Christiano Chagas, sócio da área tributária do escritório Demarest, o ajuste referente aos ganhos de 2024 seria feito apenas na declaração de 2025, e não de forma mensal, apesar de alguns títulos pagarem juros semestrais ou mensais.
4) As alterações valem para contas internacionais ofertadas por corretoras brasileiras?
Segundo os especialistas ouvidos pelo InfoMoney, todas as aplicações financeiras feitas por pessoas físicas brasileiras no exterior estão sujeitas à tributação estabelecida na MP, inclusive em contas internacionais de corretoras brasileiras.
5) Se o investidor aplicar em um ETF ou um BDR que investe no exterior, ele será tributado segundo essa nova MP?
Conforme explica o chefe de alocação da XP, Rodrigo Sgavioli, no caso de pessoas físicas que aplicam diretamente nos ativos, sem uso de estruturas (holding, fundo ou trust), a MP terá validade somente para investimentos via conta internacional e que obtiverem rendimentos a partir de 1º de janeiro de 2024.
Nesse caso, ETFs, BDRs ou fundos de investimentos globais adquiridos por meio de contas nacionais de corretoras brasileiras seguem com a mesma tributação.
6) A medida invalida os benefícios de investir no exterior?
Na avaliação de Sgavioli, o mundo caminha na direção de não mais existirem ativos “escondidos”, ou ativo com maior isonomia tributária. “Buscar eficiência tributária é importante, mas isso não invalida o investimento no exterior”, afirma.
O especialista da XP lembra que as alíquotas cobradas no Brasil para vários tipos de investimento costumam variar entre 15% e 22,5% – ou seja, a tributação proposta estaria em linha com o que é cobrado localmente hoje em dia.
7) O governo ofereceu a possibilidade de atualizar o valor dos bens e direitos detidos no exterior e presentes na declaração deste ano segundo o valor de mercado em 31 de dezembro de 2022. Nesse caso, se for apurado eventual ganho de capital em relação ao custo de aquisição, será oferecida uma alíquota mais baixa de Imposto de Renda, de 10%. A medida valerá para todos? Em que situações vai valer a pena?
Na avaliação de advogados ouvidos pelo InfoMoney, o benefício valerá tanto para quem possui investimentos no exterior por meio de trust ou entidade controlada quanto para pessoas físicas que investem diretamente por meio de uma conta internacional. Segundo a MP, o imposto apurado precisaria ser quitado até novembro de 2023.
A avaliação sobre a vantagem – ou não – de realizar essa antecipação do pagamento do tributo depende da situação específica de cada investidor. “Um investidor que possua ações no exterior e tenha perspectiva de se desfazer delas em breve pode encontrar vantagens”, diz Fábio Lunardini, especialista em Direito Tributário do Peixoto & Cury Advogados.
Um exemplo: imagine que um investidor tenha comprado ações nos Estados Unidos pelo equivalente a R$ 1.000 há dois anos. Ao fim de 2022, os papéis estavam cotados a R$ 5.000 e no momento em que o investidor almejava vendê-los, custavam R$ 5.500.
Se aderisse à antecipação do Imposto de Renda proposta na MP, o investidor poderia atualizar o valor dos papéis na declaração do IR para R$ 5.000, pagando 10% de tributo sobre o ganho de capital apurado – que seria de R$ 4.000 (igual à diferença entre R$ 5.000 e os R$ 1.000 originais). Seu custo com IR alcançaria, portanto, R$ 400.
Quando quisesse efetivamente vender tais ações, por R$ 5.500, seu ganho de capital final seria calculado sobre o valor atualizado dos papéis – que, lembrando, seria de R$ 5.000. Assim, só aplicaria a alíquota de 15% ou 25% sobre a diferença de R$ 500. Esse seria um caso em que antecipar o pagamento seria vantajoso.
Lunardini, no entanto, lembra que também pode acontecer a situação oposta – em que o investidor atualiza o valor dos seus papéis, mas até o momento da vendê-los as cotações recuam. Nesse caso, a antecipação não valeria a pena.
Na visão de Ana Cláudia Akie Utumi, sócia-fundadora da Utumi Advogado, para as pessoas que não tenham a intenção de utilizar os recursos ou realizar os ganhos no curto prazo, ou ainda que não tenham ativos líquidos, pode valer mais a pena esperar a disponibilização dos recursos – a venda das ações, considerando o exemplo acima – para pagar o IR com base nas normas atuais.
Chagas, do Demarest, diz que a opção pode ser interessante, desde que o investidor tenha liquidez, ou seja, dinheiro para pagar o imposto. Se precisar fazer um empréstimo para pagar o imposto, a opção pode não ser a melhor.
Sgavioli, da XP, também prefere ser mais cauteloso. Segundo ele, será preciso fazer as contas. “Tem que ver se ele teve algum ativo que valorizou demais e se ele está preparado para auferir esse ganho. O melhor é avaliar caso a caso”, diz.
8) O texto divulgado pela MP também trouxe novidades acerca da tributação sobre rendimentos obtidos com a variação cambial. Como funciona hoje?
Atualmente, de acordo com Chagas, do Demarest, só não há tributação sobre a remuneração obtida com a variação cambial quando os recursos são originados no exterior. Ou seja, se os recursos forem originados no Brasil e enviados para fora, já há cobrança de imposto sobre a variação cambial.
Nesse caso, o executivo defende que a tributação proposta na MP seria prejudicial, especialmente para quem possui contas internacionais há muito tempo e não possui esse tipo de tributação atualmente.
Sgavioli, da XP, por sua vez, argumenta que a medida deve afetar mais clientes de alta renda que possuem alocações elevadas no exterior. De qualquer forma, reconhece que o câmbio pode ir contra ou a favor do investidor a depender do cenário.
Por Bruna Furlani
Fonte: InfoMoney