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Diário ICANN 76 – Dia 2

ICANN 76

Por Nivaldo Cleto*

Nosso segundo diário da ICANN 76 vai tratar de uma importante questão para os empresários, que é o conjunto de discussões no entorno da nova legislação da União Europeia que trata de questões digitais, a NIS2 (Network and Information Security 2), que altera a maneira de interpretar e reagir a questões de cibersegurança no território da EU. A comunidade da ICANN[i] busca entender quais são as possíveis consequências dessa lei para o mundo dos nomes de domínio, e quais mudanças deverão ser feitas como consequência.

Durante a sessão direcionada ao tema, se mencionou que o NIS2 não é apenas uma diretiva de nomes de domínios, mas sim algo que cobre uma ampla faixa de infraestrutura cibernética crítica, então uma interpretação mais clara é necessária. Haverá novas obrigações relacionadas à coleta e manutenção de dados de registro de nomes de domínio precisos/completos. Deve ser publicado pelo menos o nome e o número de telefone e fornecer acesso a dados de registro de nome de domínio específicos para solicitações legais e fundamentadas de buscadores de acesso legítimos.

Elena Plexida (ICANN) afirmou que os estados membros devem transpor a diretiva para suas leis até outubro de 2024, e é esperado que a parte dos dados de registro gerará o maior debate. A Comissão deve especificar medidas de gerenciamento de riscos de segurança cibernética, relatando obrigações para provedores de DNS [ii]e registros de TLD[iii].

Thomas Rickert (Conselho do GNSO[iv]) explicou que esta é uma diretriz, não um regulamento. Não sabemos como cada legislador nacional interpretará isso; podemos acabar com tantos requisitos nacionais diferentes quantos os membros da UE. Há partes significativas do NIS2 que serão deixadas à interpretação da legislatura de cada Estado Membro da EU, e que a comunidade da ICANN deve se unir em suas mensagens relativas à NIS2 para garantir que aqueles que vão receber esses comentários recebam uma interpretação clara.

Michael Palage (RySG) e Lori Schulman (INTA) fizeram comentários pedindo uma participação mais ampla na interpretação do NIS2, mas ressaltaram que, em último caso, a comunidade multissetorial deve estar unida por trás de suas mensagens e interpretação do NIS2 para orientar cada um dos 27 estados membros da UE em sua transcrição para a lei nacional.

Thomas Rickert notou que existe o risco de os legisladores nacionais dizerem que os ccTLDs (TLDs de países) estão indo bem e em conformidade, e solicitar que os gTLDs[v] (TLDs genéricos) funcionem sob os mesmos padrões rigorosos. Afirmou ser necessário garantir que a comunidade da ICANN permaneça unida para que a viabilidade desse modelo siga intacta.

De modo geral, entendemos que este esforço talvez não seja tão significativo quanto o que ocorreu no caso do Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados (GDPR), mas ainda assim existe uma questão significativa que pode afetar diversos aspectos da operação normal da ICANN e dos atores envolvidos nela.

Reunião LAC SPACE

Outro importante encontro foi com os Latinos-Americanos e Caribenhos, no LAC SPACE, reunião com os membros da região para debater os principais temas de interesse para o contínuo desenvolvimento da internet. Nessa reunião coordenada pelo anfitrião Rodrigo de La Parra, Vice-Presidente Regional da ICANN para a América Latina e Caribe, foi proposto uma reunião em pequenos grupos representantes de cada região para propor mudanças a serem implementadas com o apoio da ICANN nas políticas que beneficiariam a LAC.

Um dos grupos foi formado por brasileiros (Tanara Lauchner, Flávio Wagner, Percival Henriques, Everton Rodrigues, Bruna Toso, Vinícius Santos, Marvin de Souza, Rubens Kurl e eu, os quais, após o debate, coordenado pelo representante da ICANN na América Latina, Daniel Fink (veja entrevista abaixo) apresentaram as seguintes propostas:

  • Disponibilidade de línguas da região ainda é limitada dentro da ICANN, é necessário ampliar traduções das sessões, sendo que hoje somente as sessões plenárias contam com a tradução em seis idiomas, incluindo o português.
  • Necessidade da criação de políticas de inclusão em posições de liderança, com, por exemplo, com a ampliação significativa de programas de capacitação em português ou espanhol
  • Criação de programas de mentoria regionais sobre as oportunidades que a ICANN proporciona
  • Estabelecer parcerias com atores estratégicos para ampliar o envolvimento de pessoas da região na comunidade
  • Fazer uma gestão dos fundos do “Auction Proceeds” (Receitas dos Leilões de Domínios Genéricos), direcionada para as demandas da região, em especial para aumentar a participação de jovens e a revitalização de participantes regionais na comunidade.
  • Necessidade de ampliar a participação de pessoas sediadas na região no staff da ICANN
  • Proposta a ampliação de espaços físicos com atuação regional voltada para engajamento e evangelização dos benefícios que a ICANN proporciona à comunidade, como a ampliação do escritório de Montevidéu

Essas propostas, juntamente com as demais geradas nos Grupos de Trabalho da região, foram entregues à liderança da ICANN para iniciar um trabalho que possam ter continuidade e desenvolvimento de projetos que atendam às principais reivindicações.

Isso ainda será debatido durante essa semana com as lideranças da ICANN na América Latina e Caribe.

 

Entrevista com Daniel Fink, representante da ICANN na América Latina

 

(*) Nivaldo Cleto é empresário de contabilidade e de certificação digital, conselheiro do Comitê Gestor da Internet no Brasil CGI.br e membro da ICANN Business Constituency – BC

 


[i] Criada em 1998, a ICANN teve sua primeira reunião em Cingapura em 1999 e, a partir dali, faz três reuniões por ano. Duas foram no Brasil: a ICANN-16, no Rio de Janeiro, e a ICANN-27 em São Paulo. É uma organização sem fins lucrativos, sediada em Los Angeles (EUA), que tem como função precípua cuidar da raiz de “nomes” da internet (que ancora os “domínios de topo” como .com, .net, .org, .br), e também distribuir a numeração IP (Internet Protocol) a regiões e países, que depois os repassam a entidades. Entre os domínios de topo, há os de “código de país”, como o .br (Brasil) e mais algumas centenas; e os “genéricos”, .com, .net e mais uns milhares. Importante diferença em sua caracterização: enquanto muitos dos “de país” são anteriores à ICANN e são operados sem fins de lucro gozando de autonomia, os “genéricos” têm contrato com ICANN e são, em geral, operados por instituições comerciais.

A ICANN é uma organização multissetorial: dela participam diversos segmentos da internet, da área técnica, de organizações de usuários, do terceiro setor e de representantes de governos. Tópicos recorrentes nas últimas reuniões têm sido o debate sobre necessidade de haver mais domínios do tipo genérico (e como isso seria viável de modo seguro), e formas de se combater o abuso de estruturas da internet como o DNS (Domain Name System, o sistema hierárquico de nomes). O .br vai bem nesse ponto: mesmo sendo um domínio com mais de 5 milhões de registros, está entre os mais seguros. Suas regras de registro têm se mantido constantes, fiéis aos princípios originais da internet, e é restrito a quem possui CPF ou CNPJ, portanto limitando seus registrantes a quem têm relação com o País. (Fonte: Demi Getschko)

[ii] DNS – (Domain Name System – Sistema de nome de domínio) converte nomes de domínio legíveis por humanos (por exemplo, www.amazon.com) em endereços IP legíveis por máquina (por exemplo, 192.0.2.44).

[iii] TLD – Top Level Domain, é uma parte do endereço de um site que vem logo após o último ponto da URL. Exemplos: .globo .rio .bradesco .bar .net .natura .ltda .rest. .etc

[iv] The Generic Names Supporting Organization (GNSO) é um órgão de desenvolvimento de políticas responsável por desenvolver e recomendar à Diretoria da ICANN políticas substantivas relacionadas a domínios genéricos de primeiro nível (gTLDs).

[v] gTLD (Generic Top Level Domain ) – Tipo mais básico de extensão de domínio, e também o primeiro a ser criado. Significa em português Domínio de Nível de Topo Genérico, e é utilizado na hospedagem da maioria dos sites.

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